jornalista Elson Martins - http://www.almanacre.com/ - foto daniel de andrade simões
Na minha vida de repórter sempre contei com estas duas palavras cercando minhas atividades.
Primeiro, posso dizer que foi risco e sorte, simultaneamente, eu ter me tornado jornalista auto didata quando o que queria mesmo era ser artista plástico, e quando uma pá de amigos quase me tornaram guerrilheiro.
Foi risco e sorte ter sido indicado, em 1975, para correspondente do jornal O Estado de S. Paulo no Acre. Exatamente na época dos conflitos entre seringueiros e fazendeiros, e do surgimento do líder Chico Mendes.
Foi risco e sorte ter participado da criação do jornal alternativo Varadouro, o jornal das selvas, com um grupo de ativistas políticos, ambientalistas, lideranças de bairros, gente da universidade que cutucava a onça com vara curta o tempo todo.
Foi sorte ter escapado de uma emboscada na Estrada de Boca do Acre, em 1979, junto com o delegado regional da Contag; e de ter participado do mutirão contra a jagunçada em que 300 seringueiros colocaram um grupo de 12 jagunços e 40 peões fortemente armados para correr.
Foi sorte ter participado e usufruído da fantástica rede solidária da imprensa alternativa do País, que ensinava fazer jornalismo com independência, coragem e profundo apego à democracia e à justiça.
Foi risco o tempo todo não recuar diante das ameaças dos agentes federais que não suportavam tanta ousadia contra seus patrões militares que infelicitaram o Brasil por mais de 20 anos.
Foi sorte acompanhar a criação do Partido dos Trabalhadores no Acre, então inspirado na luta dos seringueiros que impediram a transformação da floresta em pasto para bois.
Foi muita sorte, já nos anos 1990, ter ajudado um velho combatente do regime militar, João Alberto Capiberibe, ex-exilado que se tornou governador, depois senador pelo Amapá e conduziu o Programa de Desenvolvimento Sustentável do Amapá durante dois mandatos, mostrando que é possível fazer política decente na Amazônia.
Foi com muito risco que editei, durante 13 anos, o jornal Folha do Amapá, produzido na linha dos velhos alternativos dos anos 1970, com inspiração em jornais como o Coojornal, símbolo da coragem e da eficiência na comunicação a favor dos oprimidos.
Foi extrema sorte, naqueles tempos, contar com a ajuda de ex-membros do Coojornal, Gallina, Corvo, Daniel e Osmar Trindade, ex-preso político da ditadura militar que passara mais de 10 anos exilado em Moçambique. Trindade passou a editar nossa Folha do Amapá comandando uma tropa de jornalistas iniciantes, que aprenderam com ele a ser éticos, sobretudo, na elaboração de um jornal que tinha um lado, o do meio ambiente amazônico e das tradições culturais e históricas da região.
Sorte foi ter também na redação outro exilado, o Daniel de Andrade, fotógrafo excepcional que transformava assuntos corriqueiros do Amapá em capas expressivas da nossa Folha, com a beleza plástica e informação complementar contidas em suas fotos.
Sinto que neste lançamento do livro sobre o Coojornal reaparecem, juntas, as palavras risco e sorte, que orgulham os bravos jornalistas da imprensa alternativa, tão necessária, ainda, nos dias de hoje.
Rio Branco, Acre
9 de junho de 2011.
Elson Martins (ex-editor do Varadouro)
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