Tânia Miranda
São tantos os méritos do livro do famoso advogado baiano, Rui Patterson, -Quem Samba Fica – memórias de um ex-guerrilheiro -, impossível caber num pequeno texto. Mas vamos lá. Tentarei um modesto exercício.
Professora de História, durante anos, constato que nos livros didáticos, o movimento de resistência à ditadura era ignorado. O período – 1964-1985 – sempre retratado do ponto de vista dos militares, exaltando-se as “grandes ações”, como o “milagre econômico”, exemplares biografias nacionais dos presidentes. Aos poucos, também por pressão de nós professores, isso foi mudando. Mas, a resistência, quando passa a fazer parte da História do Brasil, é limitada ao eixo Rio-São Paulo. Alguns “eventos” que ocorrem em outros Estados, como a vinda de Lamarca para a Bahia – citando apenas um -, são descritos como extensões ou “necessidades” dos Estados que, de acordo com esses livros, sediavam a resistência.
Diante desse grave e lamentável erro histórico, – ainda não corrigido -, não poucas vezes, tive que “convencer” os estudantes de que a história não era bem essa. A resistência foi nacional.
A maioria dos autores de livros sobre a temática, militantes da resistência, involuntariamente, creio eu, reforçam a linha da “política dos grandes estados”. QSF-MEG: uma das raras exceções. (leiam o livro de Rui Patterson e vão perceber a desconstrução, leve e serena, intencional ou não – não sei -, dessa lógica dos “grandes estados”, porque meu propósito não é reproduzi-lo, nem seria capaz).
Aí está, um dos inúmeros méritos de QSF-MEG. A quebra desse mito. Sem tirar a importância dos livros dos sobreviventes-autores, em especial dos baianos, muito pelo contrário, quantos vierem serão bem-vindos, pela Verdade Histórica. Nossa herança maior.
foto daniel de andrade simões
Rui, codinome guerrilheiro-Roque, reconhece e homenageia a militância dos baianos, independente de suas correntes, opções, convicções, erros e acertos. Numa viagem nacional sem preconceitos, dá voz ao interior da Bahia, onde a resistência resiste. Anônima, até Rui, o Roque.
Outro grande mérito de QSF-MEG. Fazendo a ponte, sem perder o rumo, vai além de 1985 (merece outro livro, RQ). Resgata a luta dos advogados baianos em defesa dos presos e ex-presos políticos, dos perseguidos e injustiçados, pós-ditadura. Com precisão, quase cirúrgica, a árdua luta desses profissionais em defesa do livre sindicalismo, é registrada. O atual governador da Bahia, Jaques Wagner, num episódio narrado em QSF-MEG, feito uma cena cinematográfica, digna de filmes de ação, é libertado pela ação profissional- exemplar, do nosso autor, junto a outros corajosos que ele dá nomes. Quando esses profissionais, até hoje comprometidos com a democracia e a justiça, terão o reconhecimento histórico devido¿
2014: 50 anos do golpe de 64 se aproxima. É preciso acontecer. “Navegar é preciso”. Do contrário, a História “oficial” será como a contada nos livros didáticos. Longe da Verdade. À serviço dos poderosos de plantão.
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