terça-feira, 5 de junho de 2012

Do Silêncio Cúmplice à Denúncia Corajosa - por Tânia Miranda

foto daniel de andrade simões

 “Perna e rosto roxos, lábios machucados, 4 pontos na mão. Na barriga, uma gestação de 8 meses e marcas da violência. Espancada pelo marido, o filho de 4 anos a tudo assistiu”. Situações tão ou mais chocantes fazem parte dos mais de 1,5 milhão de atendimentos no 180, número da Central de Atendimento à Mulher, criada em 2006 pelo governo Lula. Mulheres feridas no corpo e na alma falam de sua dor e pedem ajuda. Os números assustam, mas não indicam, necessariamente, aumento da violência. Revelam, sim, que o silêncio cúmplice cede lugar à denúncia corajosa. A Bahia é o 2º Estado – o 1º é São Paulo - que mais aciona a Central em todo o País. Ministério Público, Defensoria Pública, delegacias, Universidades, Organizações não governamentais, compõem, entre outros, ampla rede de apoio e proteção. Violência contra a mulher é qualquer conduta, ação ou omissão, de discriminação, agressão ou coerção, ocasionada pelo fato de a vítima ser mulher. Fenômeno antigo, é uma manifestação de relações de poder historicamente desiguais entre homens e mulheres que conduziram à dominação. É o crime encoberto mais praticado no mundo.Estima-se que mais da metade das mulheres agredidas sofram caladas. Por vergonha, dependência emocional ou material, preocupação com os filhos, receio de prejudicar o agressor ou medo da impunidade.Quando adoecem, em função da violência doméstica, recorrem aos serviços de saúde alegando enxaquecas, gastrites, dores difusas e outros problemas, mas evitam a denúncia. Quando formalizam a queixa, é comum retirarem em seguida. Outras vezes, fogem para uma casa-abrigo levando as crianças e, após algum tempo, retornam ao lar. São situações que envolvem sentimentos, por vezes conflitantes, forças inconscientes, fantasias, traumas, construção e destruição.Em nossa sociedade há quem acredite que os homens são superiores às mulheres tendo o direito de impor a sua vontade. A violência é vista como uma manifestação tipicamente masculina, uma espécie de instrumento para a resolução de conflitos. O papel masculino superdimensionado reflete-se na educação dos filhos e filhas. Os papéis ensinados desde a infância levam a que meninos e meninas aprendam a lidar com a emoção de maneira diversa.O custo econômico da violência doméstica, segundo o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento, é assustador. Um em cada 5 dias de falta ao trabalho no mundo é causado pela violência sofrida pela mulher dentro de sua casa; a cada 5 anos, a mulher perde 1 ano de vida saudável em função da violência; o estupro e a violência doméstica são causas importantes de incapacidade e morte de mulheres em idade produtiva; na América Latina e Caribe, essa prática atinge entre 25% a 50% das mulheres; no Canadá os custos superam 1 bilhão de dólares canadenses por ano em serviços, incluindo polícia, justiça criminal, aconselhamento e capacitação; nos Estados Unidos gasta-se entre US$ 5 bilhões e US$ 10 bilhões ao ano. Nos países em desenvolvimento, estima-se que entre 5% a 16% de anos de vida saudável são perdidos pelas mulheres em idade reprodutiva como resultado da violência doméstica.A Conferência da Organização das Nações Unidas sobre direitos humanos reconheceu a violência contra a mulher como uma violação aos direitos humanos. Os governos dos países-membros têm trabalhado no combate a esse tipo de violência, que já é tratada, também, como um problema de saúde pública. Segundo a Organização Mundial da Saúde “as conseqüências do abuso são profundas, indo além da saúde e da felicidade individual afetando o bem-estar de comunidades inteiras.”Como a denúncia é peça chave nesse jogo de vida e morte, passo a palavra a Fernando Pessoa: “Não se acostume com o que não o faz feliz, revolte-se quando julgar necessário. (...) Se achar que precisa voltar, volte! (...) Se estiver tudo errado, comece novamente. (...) Se perder um amor, não se perca.”
Tânia Miranda - historiadora e mestre em educação: tania.miranda@terra.com.br

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