O incansável e corajoso defensor dos presos políticos e dos direitos humanos Senador Teotônio Vilela
As reivindicações esbarravam nas velhas desculpas de resolver o problema futuramente, mas nada acontecia. Nas visitas, familiares e amigos traziam comidas e sobremesas para suprir o nosso déficit nutricional. Após passar pela “fiscalização” dos agentes, tudo era reduzido a uma pasta disforme. Nesse tempo, Carlos Sarno, companheiro de organização, preso em São Paulo, veio transferido do presídio Tiradentes e, lenta e persistentemente, convenceu o diretor do presídio, da vantagem de abrir a sua cela e nela reprocessar o “rango” da cadeia, servindo-o aos outros presos. A partir desse trato, ao final das tardes, uma sopa feita com as sobras do almoço era servida, insustentavelmente leve, deliciosa para os nossos paladares de prisioneiros.Ao sentir-me provocado a narrar algo significativo desses dias de chumbo, não atinei com nada mais dignificante do que lembrar essa atitude de reprocessar e servir o almoço, a incrível sopa de fim de tarde, com seus ingredientes surgidos, ao que tudo indica, da prodigiosa imaginação de Sarno e sua sensibilidade diante do sofrimento e da violência.O reprocessamento, a sopa, fizeram-me consolidar a crença na possibilidade de um novo mundo, de que eu mesmo seria capaz de transformar-me e a todos nós, e que, a partir da sopa, jamais seríamos, citando Marx, “poeira de humanidade”. Devo a Sarno muito mais do que a comida e a sopa reprocessadas.Falando em memória, impossível não lembrar de Leopoldo Paulino e sua profecia em Tempo de Resistência: Nós podemos contar nossa história. Eles não podem contar a deles. Publicado no jornal A TARDE da Bahia em 26.12.2011 -
Fotos daniel de andrade simões Texto: mailto:advogadoruipatterson@terra.com.br